Thursday, January 27, 2011

O Narrador Parcial

     Quando voltei à casa era noite. Vim depressa, não tanto, porém, que não pensasse nos termos em que falaria ao agregado. Formulei o pedido de cabeça, escolhendo as palavras que diria e o tom delas, entre seco e benévolo.  Na chácara, antes de entrar em casa, repeti-as comigo, depois em voz alta, para ver se eram adequadas e se obedeciam às recomendações de Capitu: "Preciso falar-lhe, sem falta, amanhã; escolha o lugar e diga-me".  Proferi-as lentamente, e mais lentamente ainda as palavras sem falta, como para sublinhá-las.  Repeti-as ainda, e então achei-as secas demais, quase ríspidas,e, francamente, impróprias de um crinaçola para um homem maduro.  Cuidei de escolher outras e parei.
     Afinal disse comigo que as palavras podiam servir, tudo era dizê-las em tom que não ofendesse.  E a prova é que, repetindo-as novamente, saíram-me quase súplices. Bastava não carregar tanto, nem adoçar muito, um meio-tmero.  "E capitu tem razão", pensei, "a casa é minha, ele é um simples agregado... Jeitoso é, pode muito bem trabalhar por mim, e desfazer o plano de mamãe."

                                     (Cápiltuo XIX página 79 Dom Casmurro Machado de Assis)

Nooso narrador, Bento, ao mostrar sua determinação de evitar ser padre, está querendo mostrar ao leitor que desde criança ele tinha um amor a Capitu que o causava a fazer tudo ao redor dela.  Mas, na realidade, ele mostra o seu lado calculativo, frio e manipulativo.  Isto reflete muito ao jeito que está apresentando os fatos da estória.  Será que está fazendo igual a nós que fez com José Dias.

Thursday, January 20, 2011

O Amor Negligenciado

"-Quanto mais afunda a raiz da planta na terra, mais custa arrancá-la.  Cada passo de Iracema no caminho da partida é uma raiz que lança no coração de seu hóspede.
-Iracema quer te acompanhar até onde acabam os campos dos tabajaras, para voltar com o sossego em seu coração.
Martim não respondeu.  Continuaram a caminhar, e com eles caminhava a noite; as estrelas desmaiaram, e a frescura da alvorada alegrou a floresta.  As roupas da manhã, alvas como o algodão, aparecera no céu.
Poti olhou a mata e parou.  Martim compreendeu e disse a Iracema:
-Teu hóspede já não pisa nos campos dos tabajaras.  É o instante de separar-te dele."
                                   (Iracema, José de Alencar, página 69)


Na aula, falamos muito desta passagem e particularmente como se aplica ao personagem Martim.  Olhando novamente, esta citação diz muito mais a respeito de Iracema do que de Martim.  Com Iracema ou não, Martim vai continuar dando passos no novo mundo, mas Iracema somente está plantando novas raízes por sua causa.  Quando chegam ao limite da terra tabajara, é literalmente o fim do universo para Iracema.  Ela entra na desconhecida, com o guerreiro branco como sua única luz para iluminar o caminho.  Martim não reconhece o grande sacrifício dela.  Ele não mostra nenhuma emoção.  Isto é uma ilusão ao que vai acontecer entre eles em maior escala depois.  Iracema continuará a deixar tudo que ela conhece por ele, enquanto ele simplesmente volta a coisas já conhecidas, pelas quais tem saudade.  São os primeiros exemplos da falta de igualdade e ternura no relacionamento dos dois.  Como extensão da metáfora, é uma demonstração de como Brasil era uma grande latifúndio em relação a Portugal e a Europa inteira.

Tuesday, January 18, 2011

A Morte da Natureza no Brasil Colonial

"-Iracema te acompanhará, guerreiro branco; porque ela já é tua esposa.
Martim estremeceu.
-Os maus espíritos da noite turbaram o espírito de Iracema.
-O guerreiro branco sonhava, quando Tupã abandonou sua virgem.  A filha do pajé traiu o segredo da jurema.
O cristão escondeu as faces à luz.
-Deus!...-clamou seu lábio trémulo.
Permaneceram ambos mudos e quedos.
Afinal disse Poti:
-Os guerreiros tabajaras despertam.
O coração da virgem, como o do estrangeiro, ficou surdo à voz da prudência.  O sol levantou-se no horizonte; e seu olhar majestoso desceu dos montes à floresta.  Poti de pé, mudo e quedo, como um tronco decepado, esperou que seu irmão quisesse partir."
               Iracema, José de Alencar, página 69


Nesta obra-prima de Alencar, a protagonista Iracema é um personagem que se torna em uma força supernatural pelas descrições do autor.  Esta passagem mostra que efeito o amor entre o guerreiro branco Martim e a índia tabajara Iracema.  No primeiro momento que Martim sabe que já consumiram seu amor ele simplesmente se esconde, grita em incredulidade e treme.  Iracema é descrita como muda, queda e com um coração surdo.  Poti é descrito como um tronco decepado; um símile representante de como seu relacionamento com o guerreiro branco fê-lo separar da natureza.  Iracema, a representação humana da natureza, também está morrendo com relação à natureza.  Ela está muda, mas  a floresta sempre tem o barulho de insectos e animais.  Iracema está queda também, mas a selva sempre está se movendo, crescendo e transformando.  O coração de Iracema é a natureza e ela sendo filha do pajé escuta a voz do mato.  Como surda de coração, ela perde sua característica predominante e distintiva de escutar a voz da terra.  Os europeus quebraram o espírito naturalista puro  que existia entre os primeiros habitantes do Brasil e Alencar tem como propósito convencer o leitor da união que os antepassados do país tinham com a natureza antes da contaminação europeia.  É um pedido para o novo país do Brasil voltar à reverência da natureza.

Thursday, January 13, 2011

Sabiá de Tom Jobim e Chico Buarque

"Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Para o meu lugar
Foi lá e é ainda lá
Que eu hei de ouvir cantar
Uma sabiá

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Vou deitar à sombra
De um palmeira
Que já não há
E algum amor Talvez possa espantar
As noites que eu não queira
E anunciar o dia"
                               - de Sabiá por Tom Jobim e Chico Buarque

A gente sempre sente saudade das coisas e começa a romantizá-las.  Há duas formas de romantização; primeiro, a pessoa quer que as coisas voltem a ser como já foram, e segundo, a pessoa deseja passar pelas mesmas experiências com emoções e resultados semelhantes aos do passado, mas agora muito tempo depois.  Este poema ilustra como que uma pessoa tenta se convencer do segundo tipo de saudade. A voz poética diz "o meu lugar foi lá e é ainda lá", mas só porque algo já foi não garante que continue sendo.  A repetição de "vou" e "sei que ainda vou" retrata a falta de confidência que a voz poética tem em suas próprias convicções, assim como a frase "de um palmeira que já não há".  Este poema serve como uma reflexão do desejo impossível da saudade de recriar o passado.